quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Enforcando a consciência



O jornalista e cineasta australiano, John Pilger, conta que, na década de 1960, visitou os escritórios das grandes empresas de Tv americanas, em Saigon (Vietnã) e ficou impressionado com as fotos afixadas em quadros de parede. Eram fotografias de corpos desmembrados, de soldados americanos segurando orelhas e testículos decepados, além de várias outras retratando torturas aplicadas a vietnamitas.
- "Havia homens e mulheres sendo espancados e afogados até a morte, e humilhados de modo que me viraram o estômago" - conta ele. 
Quando Pilger perguntou se essas imagens eram publicadas pela imprensa dos EUA, responderam-lhe:
- "Claro que não. Nossos leitores não as aceitariam"
Então, um fotógrafo de uma agência de notícias, comentou: "É aqui que enforcamos nossa consciência!".

Durante o tempo em que permaneceu no Vietnã, o cineasta presenciou uma quantidade impressionante de atrocidades: assassinatos de civís, agricultores caçados a tiros por soldados americanos em helicópteros (1), "suspeito" arrastado atrás de um jipe cheio de soldados americanos dopados e às gargalhadas (2), aldeões enlouquecidos pelas bombas "anti-pessoal" despejadas sobre aldeias, escolas e hospitais.



Ele também conta que o grande fotógrafo galês, Phillip Jones Griffiths, certa vez tentou impedir que um oficial norte-americano metralhasse um grupo amontoado de mulheres e crianças vietnamitas.
- "Eles são civís" - gritou o fotógrafo.
- "E o que isso importa?" - indagou o oficial, e "rebentou" todo o grupo.

Tanto Pilger quanto Griffiths tentaram interessar as agências de notícias pela fotos que fizeram no Vietnã, mas nenhuma delas aceitou publicá-las.

O que mudou entre a época da Guerra do Vietnã e a atual Guerra do Iraque? Aparentemente nada, pois as atrocidades são aos mesmas. No Iraque a tortura é generalizada e "sistemática", como afirma a Anistia Internacional. Mas uma coisa mudou. Agora, graças a micro-câmeras, câmeras de celulares e, principalmente, graças à Internet, as imagens atrozes chegam ao conhecimento público.

Por trás de tudo o que aconteceu no Vietnã e o que hoje acontece no Iraque, John Pilger encontra um "elemento indizível", que se apresenta em quase todas as ocupações coloniais, não importa onde e quando, e que, segundo ele, é a "essência ideológica do imperialismo": o Racismo.

Na década de 1950, no Quênia, os britânicos assassinaram cerca de 10 mil quenianos e instalaram campos de concentração onde as condições eram tão duras que, em apenas um mês, morreram 402 detidos. Mas a imprensa européia só mencionava o "terror" dos Mau Mau, descritos como "negros demoníacos" que atacavam os bem intencionados brancos empenhados em "civilizar" a África.

Os soldados americanos encaravam os vietnamitas como "macacos amarelos" ou "piolhos humanos", e os massacravam como haviam massacrado os indígenas de seu país. Aliás, o Vietnã era tido por eles como "país de índios".

No Iraque, os atiradores de elite (snipers) da US Marine mataram mulheres, crianças e idosos em Fajula, como os "snipers" alemães atiravam para matar judeus no Gueto de Varsóvia.

O vice-secretário de defesa do governo Bush, Paul Wolfowitz, referia-se aos iraquianos como "serpentes" e explicava as atrocidades praticadas pelos "Marines" como necessárias para "drenar os pântanos dessa parte não civilizada do mundo".



O programa Report Mainz, de uma emissora de TV alemã, recentemente levou ao ar a acusação feita pela Cruz Vermelha Internacional de que mais de 100 crianças estão presas em centros de detenção americanos, no Iraque. . "Entre Janeiro e Maio deste ano nós registramos 107 crianças detidas, durante 19 visitas em 6 diferentes prisões.," disse o representante da Cruz Vermelha, Florian Westphal. O programa também destaca as declarações de testemunhas que viram crianças serem torturadas. O Sargento Samuel Provance, que estava alocado em Abu Ghraib, disse ter visto uma menina de 15 anos e um jovem de 16 anos sendo interrogados e submetidos a sevícias.

Seymour hersh, o repórter da New Yorker, que levantou a história das torturas no presídio de Abu Ghraib, revelou ter visto imagens e videotapes que a mídia estadunidense não exibiu. "Com as câmaras ligadas, podíamos ver as crianças sendo sodomizadas. O pior de tudo era ouvir seus gritos."

No Iraque, fala-se que os anglo-americanos já mataram mais de 11 mil civís. Mas esse número é sub-estimado. Como diz o oficial norte-americano, Adam Ingram :
- "Nós contamos até as chaves de parafusos, mas não contamos os iraquianos mortos"

Notas:
(1) Essa imagem foi usada por Francis Ford Coppola, no filme "Apocalypse Now"
(2) Essa é imagem estampada na contra-capa do livro "Crimes de guerra no Vietnã", do filósofo inglês, Bertrand Russel.

...............................................
- Alvaro Rodrigues (out-2009)

Nenhum comentário:

Postar um comentário